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segunda-feira, maio 03, 2021

DIVERGÊNCIAS ENTRE JORNALISMO E PUBLICIDADE NUM MEDIA

As NOTÍCIAS são, regra geral, o principal produto de um órgão de comunicação social convencional, sendo, por via da qualidade/quantidade e precisão com que são divulgadas as notícias que se aumenta o share(quota aparente de mercado) do referido órgão. Essa quota mediática é que atrai ou não maior ou menor adesão dos anunciantes publicitários ou a compra de espaços no órgão.


Acontece, por outro lado, que as noticias não são, na verdadeira essência, vendáveis e , mesmo na media imprensa, as vendas dos jornais mal pagam a gráfica e muito menos os salários dos jornalistas e outros trabalhadores e serviços da organização.

Apesar de as noticias serem o grande atrativo dos leitores/telespectadores/ouvintes e concomitantemente a adesão das empresas que compram espaços para os anúncios publicitários, é esta (a publicidade) que suporta as despesas em salários, matéria-prima, equipamentos, etc., tratando-se de órgãos de comunicação social que vivam de rendimentos próprios.

Para além das questões de fórum legal (incompatibilidades prescritas no Estatuto do Jornalista e Lei de Imprensa), é aqui que surge o problema/choque de interesses entre os jornalistas e os zeladores/executantes de publicidade. Há antagonismos funcionais entre os dois Departamentos (Jornalismo e Publicidade) num órgão, devido ao conflito de interesses.

Os jornalistas estão comprometidos com a verdade e as notícias, independentemente da qualidade de quem as produza (seja anunciante ou não).

Os zeladores de publicidade estão mais preocupados em manter os contratos com os anunciantes e de manter as boas relações com estes, evitando qualquer ruído na relação que possa beliscar o negócio.

O que acontece quando um grande anunciante é protagonista duma notícia a ele desfavorável e difundida pelo Departamento de Jornalismo?

1-      O anunciante queixa-se ao seu parceiro comercial, Departamento de Publicidade, atestando deselegância do órgão em não o ter protegido e ameaça retirar a publicidade.
2-      O Departamento de publicidade atira-se contra o Departamento de Jornalismo, alegando interferência negativa no negócio.

3- Há vezes em que a busca de equilíbrio entre a necessidade de manter o contrato com o cliente/anunciante e a satisfação da reclamação deste leva, algumas vezes a sacrificar o jornalista com processos disciplinares forjados e sua retirada temporária do espaço mediático.

EXPERIENCIA PESSOAL

Uma vez (terá sido em Julho de 2002), quando me encontrava diante duma agência do BFE (Angola), apareceram numa carrinha homens da EDEL (empresa distribuidora de energia de então) e polícias com mandado para proceder ao corte de energia naquela agência, situada na Joaquim Capango, em Luanda. 

Enquanto jornalista e Editor de notícias da Rádio Comercial, entendi que se tratava de um caso quase insólito (os factos ganham relevo noticioso pelo insólito). O banco tinha anunciado, dias antes, a doação de meio milhão de dólares americanos para ajudar o processo de paz iniciado a 04 de Abril, com a assinatura do memorando do Luena, um mês depois da morte do líder guerrilheiro.

Servindo-me do telefone, fiz uma peça que foi transmitida no noticiário principal da emissora.  Na peça, para além dos clientes do banco que estavam “estar passados” com a situação (na altura eram enormes as filas nas agências bancárias), ainda foi ouvido o chefe daquele piquete que exibiu a ordem de serviço e foi abordado o gerente que não quis prestar depoimentos.

O pior da história foi que o citado banco era dos principais anunciantes na rádio em que eu trabalhava e o seu PCA, ouvindo a notícia, que julgou "beliscar a imagem da sua instituição", ligou ao Departamento Comercial da Rádio ameaçando que retiraria a publicidade por não ter sido resguardada a imagem da sua instituição.

Eu que, jornalisticamente, tinha vivenciado o facto e observado o contraditório, ouvindo as partes e testemunhas, acabei sendo julgado pelo “meu chefe” como sendo culpado da situação, e tratado como "mentiroso" ou procurando atingir fins inconfessos. Um processo disciplinar foi-me instaurado e suspenso das minhas funções daquele dia até à conclusão do processo conduzido por um meu subordinado e com habilitações literárias inferiores às minhas.

Quinze dias depois, saiu o veredicto:

- Perde a condição de Editor
- Fica sem o subsidio de editor (que nunca tive antes do caso)
- Censura registada.

Esta crónica vem a propósito dum post do meu amigo Yuri Simão, no face book, sobre empresas gigantes com contas de água por saldar.

Há gigantes financeiros com muitas continhas por saldar. E pior é que não entendem ser direito do credor proceder ao corte do fornecimento.
Vezes há em que arranjam um bode expiatório para as suas distrações, como foi o caso acima relatado.

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