AS NOTÍCIAS são, regra geral, o principal produto dum órgão de
comunicação social convencional, sendo, por via da qualidade/quantidade e precisão
com que são divulgadas que se aumenta o share (quota aparente de mercado) do
referido órgão.
Essa quota mediática é que atrai ou não maior ou menor
adesão dos anunciantes publicitários ou a compra de espaços no órgão.
Acontece, por outro lado, que as noticias não são, na
verdadeira essência, vendáveis e , mesmo na media imprensa, as vendas dos
jornais mal pagam a gráfica e muito menos os salários dos jornalistas e outros
trabalhadores.
Apesar de as noticias serem o grande atrativo para a
publicidade, é esta que suporta as despesas em salários, matéria-prima,
equipamentos, etc., tratando-se de órgãos de comunicação social que vivam de
rendimentos próprios.
Para
além das questões de fórum legal (incompatibilidades prescritas no Estatuto do
Jornalista e Lei de Imprensa), é aqui que surge o problema/choque
de interesses entre os jornalistas e os zeladores de publicidade. Há antagonismos funcionais entre
os dois Departamentos (Jornalismo e Publicidade) num órgão, devido ao conflito
de interesses.
Os jornalistas estão comprometidos com a verdade e as
noticias, independentemente de quem as produza(seja anunciante ou não).
Os zeladores de publicidade estão mais preocupados em manter
os contratos com os anunciantes e de manter as boas relações com estes,
evitando qualquer ruído na relação que possa beliscar o negócio.
O que acontece quando um grande anunciante é protagonista
duma notícia a ele desfavorável e difundida pelo Departamento de Jornalismo?
1-
O anunciante queixa-se ao seu parceiro
comercial, Departamento de Publicidade, atestando deselegância do órgão em não
o ter protegido e ameaça retira a publicidade.
2-
O Departamento de publicidade atira-se contra o
Departamento de Jornalismo alegando interferência negativa no negócio.
3- A busca de equilíbrio entre a necessidade de manter o
contrato com o cliente/anunciante e a satisfação da reclamação deste leva,
algumas vezes a sacrificar o jornalista com processos disciplinares forjados e
sua retirada temporária do espaço mediático.
EXPERIENCIA PESSOAL
Uma vez (terá sido em Julho de 2002), quando me encontrava
diante duma agência do BFE (actual BFA), apareceram numa carrinha homens da
EDEL e polícias com mandado para proceder ao corte de energia naquela agência,
situada na Joaquim Capango, em Luanda.
Enquanto jornalista e editor da Comercial, entendi que se
tratava de um caso quase insólito (os factos ganham relevo noticioso pelo
insólito). O banco tinha anunciado dias antes a doação de meio milhão de
dólares americanos para ajudar o processo de paz iniciado a 04 de Abril, um mês
depois da morte de Savimbi.
Servindo-me do telefone, fiz uma peça que foi transmitida no
noticiário principal (12h30). Na peça, para além dos clientes do banco
que estavam “passados” com a situação (note que na altura eram enormes as filas
nos bancos), ainda foi ouvido o chefe daquele piquete e abordado o gerente que
não quis prestar depoimentos.
O pior da história foi que o citado banco era anunciante na
rádio e o seu PCA (actualmente num banco concorrente surgido anos depois) ligou
ao chefe de produção (área comercial da rádio) ameaçando que retiraria a publicidade
por não ter sido resguardada a imagem da sua instituição.
Eu que, jornalisticamente, tinha vivenciado o facto e
observado o contraditório, ouvindo as partes e testemunhas, acabei sendo
julgado pelo “meu chefe” como culpado da situação, e tratado como mentiroso. Um
processo disciplinar foi-me instaurado e suspenso das minhas funções daquele
dia até à conclusão do processo conduzido por alguém com
habilitações literárias inferiores às minhas e sem conhecimento específico sobre a ciência jurídica.
Quinze dias depois, saiu o veredicto:
- Perde a condição de Editor
- Fica sem o subsidio de editor (que nunca tive antes do
caso)
- Censura registada.
Esta crónica vem a propósito dum post do meu amigo
Yuri Simão, no face book, sobre empresas gigantes com contas de água por
saldar.
Há gigantes financeiros com muitas continhas por saldar. E
pior é que não entendem ser direito do credor proceder ao corte do
fornecimento.
Vezes há em que arranjam um bode expiatório para as suas
distrações, como foi o caso.
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