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quarta-feira, novembro 26, 2025

O KIMBUNDU E UMBUNDU – LÍNGUAS NACIONAIS CODIFICADAS – E O CASO DO NGOYA

1. INTRODUÇÃO

Angola é um país de grande diversidade linguística, onde coexistem o português — língua oficial — e várias línguas nacionais de origem
bantu. Entre estas, destacam-se o Kimbundu e o Umbundu, línguas com tradição oral, produção literária emergente e crescente reconhecimento institucional. O Kibala (ou Ngoya), por sua vez, representa um caso singular de debate linguístico e identitário, situado entre a variante dialectal e a possível língua autónoma.

2. LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA E DISTRIBUIÇÃO DAS LÍNGUAS

2.1. Kimbundu

Falado predominantemente nas províncias de Luanda, Bengo, Cuanza Norte, Malanje e partes do Cuanza Sul e Uige, o Kimbundu é a língua do grupo Ambundu. Com mais de 3 milhões de falantes, apresenta estrutura tonal, sistema de classes nominais e forte prefixação verbal e nominal. É uma das línguas bantu mais estudadas em Angola, com influência lexical no português angolano e brasileiro.

2.2. Umbundu

Predomina nas províncias do Huambo, Bié, Benguela, partes da Huila, Namibe e Cuanza Sul, sendo a língua do grupo Ovimbundu. É a língua nacional mais falada em Angola, com forte presença na educação, cultura e comunicação social. A sua estrutura gramatical e riqueza lexical têm sido objeto de estudos linguísticos e etnográficos.

2.3. Kibala (ou Ngoya)

Falado na região da Kibala, abrangendo localidades como Hebo, Kilenda, Lubolu, Mbwim e Waku, é considerado por alguns estudiosos como uma variante do Kimbundu, enquanto outros defendem a sua autonomia linguística. O termo “Ngoya” é exógeno, usado por comunidades vizinhas, enquanto os falantes se referem à sua língua como “Kimbundu da Kibala” ou "Nosso Kimbundu".

3. INSTRUMENTOS NECESSÁRIOS PARA A AUTONOMIZAÇÃO DE UMA LÍNGUA

A autonomização de uma língua — ou seja, o processo pelo qual uma variante dialectal passa a ser reconhecida como língua independente — é um fenómeno linguístico, político, social e cultural. Não há uma única autoridade que o define, mas sim um conjunto de actores e etapas que contribuem para essa legitimação.

3.1. Codificação e Normalização

  • Gramática própria: Regras definidas de morfologia, sintaxe e fonologia.
  • Ortografia padronizada: Sistema de escrita consensual e estável.
  • Dicionário: Repertório lexical que legitima o vocabulário da língua.

3.2. Produção Escrita e Literária

  • Textos literários, científicos e jornalísticos.
  • Traduções para e a partir da língua, demonstrando sua capacidade de comunicação universal.

3.3. Reconhecimento Institucional

  • Inclusão em currículos escolares, exames e documentos oficiais.
  • Políticas linguísticas de promoção e preservação.

3.4. Uso Social Alargado

  • Comunidade de falantes nativos e fluentes.
  • Presença nos media: rádio, televisão, internet, redes sociais.

3.5. Autonomia Identitária

  • Sentimento de pertença.
  • Distinção funcional em relação a outras variantes.

4. QUEM DEFINE A AUTONOMIZAÇÃO DE UMA LÍNGUA?

  • Comunidade de falantes: O reconhecimento começa internamente, com o sentimento de identidade linguística.
  • Linguistas e académicos: Estudam, descrevem e codificam a variante.
  • Instituições políticas e educativas: Oficializam a língua e promovem sua inclusão nos sistemas de ensino.
  • Organismos internacionais: Como a UNESCO e o ISO, que atribuem códigos linguísticos.

5. COMO SE PROCESSA A AUTONOMIZAÇÃO?

  • Codificação linguística: Elaboração de gramática, ortografia e dicionário.
  • Produção cultural: Literatura, música, teatro, imprensa.
  • Mobilização social: Movimentos culturais e comunitários.
  • Reconhecimento oficial: Declaração como língua nacional, regional ou co-oficial.

6. COMO SE DEFINE O NOME DE UMA LÍNGUA?

O nome pode derivar de:

  • Autodenominação dos falantes (ex.: Umbundu).
  • Topónimo ou região (ex.: Catalão).
  • Grupo étnico ou cultural (ex.: Zulu).
  • Termo histórico ou tradicional (ex.: Latim, Tétum).

Em alguns casos, o nome é disputado ou evolui com o tempo, conforme o reconhecimento político ou académico.

7. O CASO DO NGOYA: LÍNGUA OU VARIANTE?

Kibala (ou Ngoya) representa um exemplo paradigmático do debate sobre a sua denominação e autonomização linguística. Estudos como os de Tomé Grosso, Ndonga Mfwa, Gabriel Vinte e Cinco e Soberano Kanyanga apontam para uma variante do Kimbundu com identidade própria, falada na região da Kibala e zonas contíguas. A sua autonomização depende da aplicação dos instrumentos descritos, bem como do reconhecimento da sua identidade linguística pelos falantes e pelas instituições públicas.

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • Angenot, Jean-Pierre; Mfuwa, Ndonga; Ribeiro, Michela Araújo – As classes nominais do Kibala-Ngoya.
  • Araújo, Paulo Jeferson Pilar; Petter, Margarida – O quimbundo e o português do Libolo.
  • Canhanga, Luciano (Soberano Kanyanga) – A língua dos Kibala – Kimbundu ou Ngoya?
  • Cobbinah, Alexander – Lubolo-Ngoya | Endangered Languages Archive.
  • Grosso, Tomé – Monografia sobre o Dialecto Kibala e o termo Ngoya.
  • Jordan, Linda; Manuel, Isata – Sociolinguistic Survey of Kwanza Sul Province.
  • Kitumba, Evaristo – Problemática linguística da província do Kwanza-Sul.
  • Mfwa, Ndonga – Estudos sobre variantes do Kimbundu e o caso Ngoya.
  • Ndombele, Eduardo David – Reflexão sobre as línguas nacionais no sistema de educação em Angola.
  • O Pais – Colectânea “Letras sobre as Línguas de Angola”.
  • Pinto, Hermenegildo – Umbundu: caminhos para a sua preservação.
  • Ramos, Rui – A Língua Kimbundu.
  • Sacalembe, Júlio – Políticas linguísticas em Angola.
  • SIL International – Sociolinguistic Survey of Kwanza Sul Province.
  • Wikipedia – Ngoya language.

domingo, novembro 02, 2025

ILUKE

(Pseudo-sepultura)

É uma alegoria. Uma imitação do sepulcro real onde repousam os restos do finado.

Uluka=atribuir nome/pseudônimo

Iluke=réplica/homónimo


Nas comunidades rurais do Libolo (e xonas adjacentes), quando alguém morre distante e não é transladado seu corpo para a origem, é feito um pseudo-funeral (iluke) em que se colocam em uma pequena urna pertences do de cujus (pode ser resto de cabelo, unhas etc.) que são sepultados como se de um corpo cadavérico se tratasse.  Tal visa "acalmar os espíritos do defunto" e servir de memória para a comunidade.

Por cima da campa, à semelhança dos sepultamentos reais, é anotado o tempo de vida do "homenageado.

Iluke é uma espécie de túmulo de soldado desconhecido.