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sábado, julho 15, 2017

MALAVU OU LUNGILA?

Essa é uma pergunta comum quem visita as aldeias interiores do Uige. O café também conhecido como bago vermelho é, sem dúvida, o ex-libris do Songo e outros municípios do Uije. Mas, não é tudo. No Songo, por exemplo, também se vêem montanhas que desafiam os céus como na aldeia de Zulumongu (o céu é a montanha) e se bebe malavu (designação do vinho de palma em Kikongu)ou lungila (aturem-me em Kikongu) que é um fermentado a base de sumo de cana de açúcar.
- Então, vai uma bebida?
- Sim. Sirva Lungila!
Nesta viagem turística e exploratória sobre os usos e costumes dos nossos povos, também pude constatar que os topónimos, no Uige, regra geral emergem de hidropónimos, de antropónimos de fundadores das comunidades ou de eventos sociais, culturais ou naturais relevantes, uma característica que se pode dizer: geral em Angola, sem muita margem de erro.
 
Exemplos:
Zulumongu (o céu é montanha), Uije.
Kipala kya Samba (rosto de Samba), Kwanza-Sul.
Kambambi (friozinho), Kwanza-Norte
Baixo Longa (rio Longa) no Kwandu nyi Kuvangu
Ngonguembo (Ngonga yo wembu) Kwanza-Norte
babaera/Ovav'ayela (água límpida/cascata) Ganda/Benguela
Pedra Escrita (anúncio publicitário feito em pedra deu nome à aldeia) no Libolo), etc.
Outra constatação, cuja reflexão se espera melhor desenvolvida e fundamentada, tem a ver com as línguas faladas na extensão do Uije e as zonas de "penumbra linguística". Busco aqui uma analogia com a física, uma ciência da natureza para procurar explicar o que se passa com as imagináveis fronteiras linguísticas cujos marcos (inexistentes) nada têm a ver com as fronteiras político-administrativas. Se para separar os territórios das aldeias, comunas, distritos urbanos (têm estatuto semelhante às comunas rurais), município e províncias servem como separadores as ruas, avenidas, elevações, rios, cadeias montanhosas, etc., com as línguas, seja no Uije ou outro território, acontece de forma diferente. Não há fronteiras tangíveis. no Negaje, por exemplo fala-se Kimbundu! No Noroeste do Uije locuciona-se em Ucokwe ou língua aparentada. Na zona de fronteira imaginária entre dois grupos etnolinguísticos há sempre uma zona de transição que é, nada mais do que, a fusão de elementos lexicais dos dois grupos predominantes, sendo que essa "penumbra" se vai dissipando enquanto mais nos aproximarmos do núcleo de uma determinada língua.
 
Por isso, política é política. Entre os do Uije nem todos são bakongu!


Texto publicado pelo jornal Nova Gazeta

sábado, julho 01, 2017

RESPONSABILIDADE SOCIAL E MARKETING FUTURISTA


Uma dada indústria vocacionada à produção de água, sumos, refrigerantes, detergentes diversos e finalmente cerveja decide agregar ao seu marketing de resultados futuristas a já assinalável Responsabilidade Social Corporativa.



Entre várias façanhas de elevado mérito, decide apoiar crianças, adolescentes e jovens acolhidos por centros sociais. Tem o "pacote cervejeiro" como aquele que inspira maior investimento em termos de marketing imediato e mediato, dada a fasquia de mercado que as cervejeiras tradicionais ocupam e a renhida "batalha" que há entre as cervejeiras tradicionais do mercado, as emergentes e ainda as marcas internacionais, todas procurando conquistar os novos consumidores.



A indústria que elegemos como estudo, no âmbito da sua responsabilidade social corporativa,, trabalha com crianças, jovens e adolescentes. Responsáveis e técnicos têm metalizados os aspectos morais, éticos e legais de que não se deve publicitar explicitamente bebidas alcoólicas entre menores de idade. Porém, escolhe a "praça do tigre", que homenageia a sua marca cervejeira, para uma palestra orientada por um escritor que aborda "a importância da leitura e do domínio das línguas para o sucesso escolar e desenvolvimento intelectual".



Na "praça" onde os produtos líquidos bebíveis pleiteiam espaço é a alcoólica que mais invade os olhos. Mas dela não se fala, senão no final da aplaudida e concorrida palestra.

Perante refrigeradores repletos de bebidas sortidas, as crianças e adolescentes quase se perdem no exercício de fazer gosto à sede e ao paladar. Mas a coordenadora da actividade solta a voz e aconselha:



- Bebam tudo, menos cerveja.

- Sim. Não bebam cerveja. Há tempo para tudo. Não tenham pressa. Desfrutem. Sem olhos para o álcool. - Acrescentou o palestrante, também ele atendo e preocupado.


Talvez contrariados, talvez não, os mais crescidos. Mas todos acataram e declararam "guerra à água que era pura, aos refrigerantes e aos sumos. Os dentes também tiveram trabalho para triturar os docinhos e salgadinhos. Depois, foram apenas arrotos.



Propositado ou não, os homens do marketing sabem que devem investir em captar consumidores para hoje, amanhã e sempre. É por isso que oferecem águas, sumos e gasosas mas, quase sempre, mostrando a cerveja entre esses produtos. As crianças e adolescentes de hoje serão, com certeza, os destinatários da cerveja do amanhã. Por tal facto, agregam a responsabilidade social corporativa ao marketing de resultados futuristas.



SC: 22.04.2017