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domingo, junho 21, 2009

POR QUE NÃO DESENVOLVER AS LÍNGUAS NACIONAÍS?

A língua é o principal elemento identitário. É, por si só, o meio de afirmação cultural de um povo e elemento diferenciador deste mesmo povo com outros povos ou comunidades.

Sendo Angola um Estado multi-cultural, no qual se ergue uma Nação política, é de levada importância o conhecimento, a divulgação e desenvolvimento das distintas línguas e dialectos existentes, o que permitirá compreender, do ponto de vista científico e filosófico, a composição dos aglomerados populacionais do país, suas relações de dependência e interdependência e a utilidade comunicacional das línguas locais para o desenvolvimento histórico-cultural, económico e político de uma nova sociedade angolana.

As línguas locais são igualmente o meio que nos permite distinguir os parentescos e os distanciamentos entre os povos que há muito habitam o que é hoje o território angolano. Por isso, tendo em conta o desenvolvimento globalizante, a ausência de estudos, promoção, divulgação e ensino das línguas locais angolanas às mais novas gerações pode lavar ao seu esquecimento e consequente desaparecimento, o que a acontecer significaria o aniquilamento de culturas, jamais recuperáveis na sua integridade.

Note-se também que é insignificante ou quase nula a bibliografia em línguas locais angolanas, excepção seja feita ao kimbundu, umbundu e kuanhama (Namíbia).

Por outro lado, a existência de comunidades onde a comunicação é feita predominantemente em línguas locais, faz com que determinadas mensagens difundidas noutras línguas não surtam o efeito imediato desejado e não crie a motivação para a acção que teriam se a comunicação fosse feita na língua com que se identificam.

Campanhas sobre prevenção contra doenças e outros perigos, ética e civismo, comportamento eleitoral, preservação ambiental entre outras devem também ser feitas em línguas locais para que alcancem os efeitos desejados.

Logo, a par da língua portuguesa que é o símbolo de identidade angolana e pilar basilar para a construção da Nação, asa línguas locais (também chamadas de nacionais) e seus sub-grupos ou dialectos devem ser objecto de investigação, divulgação e ensino, de modo a perpetuá-las e ocuparem o seu lugar no desenvolvimento socio-económico, político e cultural de Angola.

Devemos entender que “um povo sem cultura não é um povo” e uma cultura funda-se num veículo de transmissão de ideias, sentimentos, crenças, ritos e atitudes, ou seja, uma língua.

E como dita a minha tradição “kaiete lia sapo caioto”, eis aqui a minha contribuição.

Ngoia: Kaiete lia sapo Kaioto.
Tradução literal para português: uma conversa sem provérbio não anima.
Sentido pedagógico:
uma exposição sem exemplos não convence. Ou seja, toda exposição tem de ser seguida de exemplos. Não basta dizer, é preciso demonstrar.

Na foto: Luciano Delfim Canhanga
Por: Luciano Canhanga /Fev. 2005

sábado, junho 06, 2009

A CARGA PEDAGÓGICA NOS PROVÉRBIOS AMBUNDU

A zona sobre qual me debruço é a que vai do Libolo a Kibala, abrangendo Kilenda, Ebo, Gabela, Mussende e partes do Uaco-Kungo, Kassongue entre outros espaços da Província do Kuanza-Sul.

Trata-se de uma zona de transição etno-linguística entre os ovimbundu e os ambundu. Por isso, a língua contém elementos de duas outras línguas, com maior ou menor acentuação ou prodominância, à medida que se vai aproximando ou distanciando dos pólos (ambundu e ovimbundu).

No período da existência do reino do Ndongo, o Libolo, a Kibala, Ebo, Kilenda, Gabela e até parte do Uaco Kungo integravam este reino, razão pela qual, ainda hoje, quando perguntamos às pessoas destas áreas que língua falam, muitos respondem que falam Kimbundu. Porém, há as que dizem falar Kibala ou Ngoya, conforme um estudo publicado nesta pa'gina.
Sobre a origem dos povos Kibala, demonstrou-o, e muito bem, o Reverendo Vinte e Cinco no seu livro “Os Kibalas”. Também o Dr. Moisés Malumbu no seu livro “Os Ovimbundos do Planalto Central de Angola” faz excelentes apreciações sobre os povos vizinhos dos ovimbundu e das relações de interdependência entre eles.
Malumbu diz mesmo que os actuais povos Mbalundu e Ndulo (Bailundo e Andulo), dos quais nascem os povos planálticos dos nossos dias, são descendentes dos Kibala a quem os ovmbundu tratam por Va-kua-nano (os de cima/norte).
Porém, não basta esta relação de pertença para se dizer, como muitos o fazem, que que os povos que habitam o Kuanza-Sul são "bailundus ou kimbundus" por extensão. Têm uma língua e características próprias. Costumes que fazem uma cultura e língua próprias e que devem ser estudas. Têm também os seus provérbios com grande carga pedagógica.

No que toca a outras particularidades da Cultura e História, é só ver que nenhum outro povo, dos que habitam Angola, construiu necrópoles (sepulturas em pedras) senão os ancestrais dos Kibalas e seus vizinhos.

O que partilho convosco é que independentemente dos kibalas falarem uma língua parecida com o kimbundu ou umbundu, esta língua tem um nome. Tratemo-la por Kibala ou Ngoya (termo depreciativo mas muito divulgado), ela deve ser divulgada de modo a legá-la a novas gerações. Para que tal aconteça é preciso que seja investigada, divulgada e ensinada.

Tenhamos como exemplo a própria língua portuguesa que falamos, herdada do colono. É uma língua que deriva do latim, tal como o espanhol, o italiano, o francês, o romeno, entre outras e recebe empréstimos do inglês e línguas africanas.

-O português é ou não uma língua própria?-Tem ou não um nome?-É ou não estudado, desenvolvido, divulgado e transmitido a novos falantes?Este exemplo chama-nos atenção para o que devemos fazer para a valorização da nossa língua.

Não quero, aqui e hoje, definir que nome atribuir à nossa língua. Pesquisei um pouco e encontrei várias divergências entre os autores. Mas que temos que investigar, isso temos.

Em seguida quero mostrar-vos o que tenho feito para demonstrar a carga pedagógica dos provérbios da nossa língua.

Sentido pedagógico dos provérbios

Permitam-me que vos fale, ANTES, um pouco da Grécia antiga, tida como “a terra do franco falar” pela liberdade existente na altura dos grandes filósofos como Sócrates cuja escola forjou o grande Platão (Atenas) e a Academia, Aristipo (Cirene) e os Cirenaicos, Diógenes e os Cínicos, Euclides (Megara) e os Megáricos, entre outros.

Hoje, mais de 25 séculos passados, O "grande mestre" tem sido ainda opção preferida de muitos educadores que lembram o hábil inquiridor que finge tudo ignorar para tudo demolir, e investir, a seguir, despido dos julgamentos precipitados, na construção do saber, legitimado pela participação do interlocutor. É a refutação e a maiêutica. Assim é também a escola AMBUNDU nos seus fundamentos didácticos.

Vejamos os casos seguintes:

1.-Úlielela kufula, kuimba ndungue úputu. (confiar é falhar, aconselhar é carência de actividade).

Depois de uma introspecção, o jovem deve concluir que: é preciso ter sempre um plano alternativo e não confiar demasiadamente numa única via.

Em educação, as teorias vão e vêm, as experiências se sucedem, mas, por vezes, algumas ideias permanecem e algumas experiências resistem, ainda que de forma parcial, a novas práticas.

Vejamos agora:
_Uateleka sanji li uilo ué. Literalmente para português quer dizer que: quem cozinha uma galinha também tem vontade de comer carne.

Sentido pedagógico: Um convite para se estar à vontade não deve significar libertinagem.

Em que contexto se aplica? Lá na Kibala quando se abate uma galinha para uma visita ela deve ser servida completa. Os anfitriões comem o que restar da mesa. O convidado deve porém saber que pelo facto de lhe ter sido servido o frango completo não significa que os anfitriões não gostem de carne de galinha.

Os provérbios em ngoya reflectem também um ensino virado para a experiência.

Quantos apressados terão sido arrastados pela corrente de um rio sazonal por imprudência?Aqui a nossa sabedoria dita através de mais um provérbio:

-O luiji ki luezuka lupixile. (se o rio estiver cheio deixe-o passar).

O ensinamento é que: se alguém estiver furioso deixe-o descarregar toda a sua fúria e aborde-o depois para chamá-lo à razão. Pelo contrário não haverá entendimento. Ou ainda, se se deparar com um conflito deixe primeiro amainar os ânimos. Não seja apressado.


Bibliografia
-Baptista Mondin: Introdução a Filosofia
-Gabriel Vinte e Cinco: Os kibalas
-Gilda Naécia de Barros: Sócrates -Raízes Gnosiológicas do Problema do Ensino- Conferência na Fac. Educação da Universidade de São Paulo.
-Moisés Malumbu: Os ovimbundos do planalto central de Angola, 2005.

Texto tb. publicado em: www.canhanga.blogspot.com

Luciano Canhanga

segunda-feira, junho 01, 2009

A NEGAÇÃO NA LÍNGUA DOS KIBALA

A língua dos Kibala é o termo que utilizo para caractarizar o dialecto ambundu falado no Kuanza-Sul.

Tal como noutras línguas existem frases afirmativas e negativas.

1-A negação é formulada através do uso do prefixo ka.

- Uete li uoma u landandi? -tens medo das pedras?
- Kangete -não tenho!

-O mana u sanji a tenena? -Os filhos da galinha estão completos)?
-Katenene!- não estão completos.

2 Há casos em que se abrevia, na expressão oral, o prefixo ka substituindo-o apenas por ngi.
-Uali honja? - comeste banana?
-(Ka) Ngilile -não comi

-Lelo eye uele ku xikola? -Hoje (tu) foste à escola?
-Kangile. Mesene yo kata -Não fui. O mestre está doente.

Ku'aiaxike ki k'uitena! -Não comeces se não consegues

Luciano Canhanga